sábado, 24 de maio de 2014

Tardes I

“Entro na casa onde nasci
O tempo emprestou sem dó uma cor
Amarelada  às suas paredes.” ______Manoel De Barros


A porta aberta deixava entrar em suas paredes nuas um vento frio e calmo. Entardecia... E o céu tinha cores  rubras e cinzas. Fui entrando devagarinho naquele santuário... Passei meus olhos pelos lugares onde antes ficava a máquina de costura, os quadros e retratos da família. Entrei silenciosamente nos quartos e ali ainda encontrei vestígios  da vida que ali vivi. Algumas folhas soltas dos cadernos, pedaço de uma história que tinha ido embora... Uma mala... Tinha uma mala naquele quarto antes habitado por nós, Num frenesi de ansiedade procurei ver o que ali restava. O amarelado do tempo se fazia imperar... As calçadas altas  com os seus degraus estavam em ruínas, e naquele tarde o meu coração também. As lembranças jorravam em turbilhões... eram vozes, cheiros, sabores, tudo vinha engolfando-se, sobressaindo-se nos sentidos aguçados pela solidão da tarde... Os terreiros de terra vermelha, os currais, as árvores e o grande juazeiro do quintal já não estavam ali, apenas o mourão se mostrara resistente ao tempo que passou... para onde fomos todos?  Outras construções, outros vizinhos foram chegando... Parei no meio do silêncio, aquietei a tarde dentro de mim e fui embora sem coragem de olhar para trás porque sei que as lembranças acenariam e eu já havia guardado todas na mala que ficou no canto esquecida...

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